Washington Simões
A Arqueologia e a Espeleologia estão intimamente ligadas há milhões de anos… Desde que os hominídeos começaram a se diferenciar dos grandes macacos, tanto no ramo da alimentação, do comportamento, inclusive no jeito de andar (ereto) e de viver em bandos familiares, eles freqüentaram abrigos e cavernas.
Lá, longe das árvores de proteção precária, eles desenvolveram meios de sobrevivência mais eficientes, seguros e duradouros, adaptaram as suas necessidades alimentares aos meios disponíveis, tornando-se onívoros, prosseguindo comendo vegetais, porém não desprezando carnes e grandes insetos encontrados no nível do solo. Depois vieram as ferramentas líticas, frutos da sua imaginação e desenvolvimento cerebral, em nova etapa da sua adapatação e evolução.
Esse progresso todo culminou com o aproveitamento do fogo que lhe proporcionava conforto, segurança e supremacia sobre os outros membros do reino animal.
Assim, já temos quase o “homem” morando em cavernas e arrumando o seu refúgio nessas cavidades naturais, que lhe forneciam abrigo contra a rudeza do clima, morada e aconchego, além de esconderijo contra seus inimigos naturais. Sazonalmente voltava ao mesmo local, reencontrava alguma lenha seca, ferramentas ocultas numa fresta de rocha, área próxima da caça, onde os animais tinham esquecido da sua presença. Novamente ia acender uma fogueira perto da entrada, porém fora do alcance da chuva: ao redor dela, descarnava a sua caça, lascava ou retocava as suas ferramentas.
Um pouco mais tarde, certos locais inspiraram esse “primitivo”, que no silêncio da mata soltava a sua imaginação, pintando em paredões lisos ou gravando na rocha friável, mensagens para as gerações futuras, sinais para se lembrar de fatos singulares, ou, talvez, uma súplica para alguma entidade superior, da qual ele precisava de ajuda neste mundo um tanto hostil e perigoso.
Inúmeros exemplos podem ser dados dessa parceria arqueologia/espeleologia, ou seja, uma ciência que em grande parte existe pela atuação da outra: o “homem” desta época sendo redescoberto pelo espeleólogo que freqüenta os mesmos espaços, vários milênios depois, quando não são dezenas ou centenas de milênios…
As mais marcantes descobertas deste século XX se referem a achados extremamentes antigos, alguns como nas cavernas de Chucutien e Lantian, na China (650/700 mil anos), Sterkfontein, Makapansgat, Swartkrans, Cavern Border, todas na África do Sul, outras como as de Neander e Vogelherd, na Alemanha, Petralona, na Grécia, Shanida, Jebe Qafzeh, Tabun, Mugharet Es Skhul, em Israel, e todas as mais conhecidas e recentes (30 a 40 mil anos) da França, tais como: Le Moustier, Mas D’Azil, La Vache, Font-de-Gaume, Pech Merle, Lascaux, Le Tuc D’Audoubert, Tautavel, entre outras. Sem nos esquecermos de Altamira, na Espanha. Essa lista poderia ser alongada em centenas de linhas, e ainda poderíamos esquecer de algumas.
Isto comprova que o homem primitivo, sempre que possível, utilizou as cavernas para viver e se abrigar, e que as descobertas não cessam de acontecer, como confirma a localização recente de duas grutas magníficas, a de Cosquer (1991), a qual tem a sua entrada submersa, protegendo durante mais de 30 mil anos as obras de arte das intempéries e dos depredadores. A outra famosa, também francesa, é a de Chauvet (1994). Uma raridade pelo fato de conter desenhos e pinturas de fauna nunca encontrada em cavidades similares da mesma época, ou mesmo, próxima.
Sempre o espeleólogo é ligado a esses achados que são manchetes da imprensa internacional. O acervo cultural de cada país vai aumentando regularmente, e o Brasil não é exceção a essa regra. Praticamente desconhecido no início do século, o rico conteúdo pictográfico das nossas cavernas e abrigos dos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Piauí, e mesmo São Paulo, vai se revelando. Outros estados são também possuidores de riquezas rupestres escondidas e necessitam de mais prospecção, pesquisas e especialistas para mostrar ao mundo o nosso passado ilustrado em painéis coloridos.